Vida Espírita

Vida Espírita

 

      223. A alma se reencarna imediatamente após a separação do corpo?

     — Às vezes, imediatamente, mas, na maioria das vezes, depois de intervalos mais ou menos longos. Nos mundos superiores a reencarnação é quase sempre [mediata. A matéria corpórea sendo menos grosseira, o Espírito encarnado goza de quase todas as faculdades do Espírito. Seu estado normal é o dos vossos sonâmbulos lúcidos.

      224. O que é a alma, nos intervalos das encarnações?

      — Espírito errante, que aspira a um novo destino e o espera.

      224 – a) Qual poderá ser a duração desses intervalos?

      — De algumas horas a alguns milhares de séculos. De resto, não existe,propriamente falando, limite extremo determinado para o estado errante, que pode prolongar-se por muito tempo, mas que nunca é perpétuo. O Espírito tem sempre a oportunidade, cedo ou tarde, de recomeçar uma existência que sirva à purificação das anteriores.

      224 – b) Essa  duração está subordinada à vontade do Espírito, ou pode lhe ser imposta como expiação?

      — É uma conseqüência do livre-arbítrio. Os Espíritos sabem perfeitamente o que fazem, mas para alguns é também uma punição infligida por Deus. Outros pedem o seu prolongamento para prosseguir estudos que não podem ser feitos com proveito a não ser no estado de Espírito.

        225. A erraticidade é, por si mesma, um sinal de inferioridade entre os Espíritos?

      — Não, pois há Espíritos errantes de todos os graus. A encarnação é um estado transitório, já o dissemos. No seu estado normal, o Espírito é livre da matéria.

         226. Pode-se dizer que todos os Espíritos não-encarnados são errantes?

      — Os que devem reencarnar-se sim; mas os Espíritos puros, que chegam à perfeição, não são errantes: seu estado é definitivo.

Comentário de KardecNo tocante à suas qualidades intimas, os Espíritos pertencem a diferentes ordens ou graus, pelos quais passam sucessivamente, à medida que se purificam. No tocante ao estado, podem ser encarnados, que quer dizer ligados a um corpo; errantes, ou desligados do corpo material e esperando uma nova encarnação para se melhorarem; Espíritos puros ou perfeitos e não tendo mais necessidade de encarnação.

          227. De que maneira se instruem os Espíritos errantes; pois certamente não of azem da maneira que nós?

    — Estudam o seu passado e procuram o meio de se elevarem. Vêem, observam o que se passa nos lugares que percorrem; escutam os discursos dos homens esclarecidos e os conselhos dos Espíritos mais elevados que eles, e isso lhes proporciona idéias que não possuíam.

        228. Os Espíritos conservam algumas das paixões humanas?

    — Os espíritos elevados, ao perderem o seu invólucro, deixam as más paixões e só guardam a do bem; mas os Espíritos inferiores as conservam, pois de outra maneira pertenceriam à primeira ordem.

         229. Por que os Espíritos, ao deixar a Terra, não abandonam as suas más paixões, desde que vêem os seus inconvenientes?

     — Tens nesse mundo pessoas que são excessivamente vaidosas. Acreditais que, ao deixa-lo, perderão este defeito? Após a partida da Terra, sobretudo para aqueles que tiveram paixões bem vivas, resta uma espécie de atmosfera que os envolve guardando todas essas coisas más, pois o Espírito não está inteiramente desprendido. É apenas por momentos que ele se entrevê a verdade, como para mostrar-lhe o bom caminho .

       230. O Espírito progride no estado errante?

      — Pode melhorar-se bastante, sempre de acordo com a sua vontade e o seu desejo; mas é na existência corpórea que ele põe em prática as novas idéias adquiridas.

      231. Os Espíritos errantes são felizes ou infelizes?

      — Mais ou menos, segundo os seus méritos. Sofrem as paixões cujos germes conservaram, ou são felizes, segundo a sua maior ou menor desmaterialização. No estado errante, o Espírito entrevê o que lhe falta para ser feliz. É assim que ele busca os meios de o atingir; mas nem sempre lhe é permitido reencarnar à vontade, e isso é uma punição.

      232. No estado errante, os Espíritos podem ir a todos os mundos?

      — Conforme. Quando o Espírito deixou o corpo, ainda não estácompletamente desligado da matéria e pertence ao mundo em que viveu ou a  um mundo do mesmo grau; a menos que, durante sua vida, se tenha elevado. Esse é o objetivo a que deve voltar-se, pois sem isso jamais se aperfeiçoaria. Ele pode, entretanto, ir a alguns mundos superiores, passando por eles como estrangeiro. Nada mais faz do que os entrever, e é isso que lhe dá o desejo de se melhorar para ser digno da felicidade que neles se desfruta e poder  habitá-los.

      233. Os Espíritos já purificados vêm aos mundos inferiores?

      — Vêm freqüentemente, afim de os ajudar a progredir. Sem isso, essesmundos estariam entregues a si mesmos, sem guias para os orientar.

 

      234. Existem, como foi dito, mundos que servem de estações ou de lugares de repouso aos Espíritos errantes?

      — Sim, há mundos particularmente destinados aos seres errantes, mundos que eles podem habitar temporariamente, espécie de acampamentos, de lugares em que possam repousar de erraticidades muito longas, que são sempre um pouco penosas. São posições intermediárias entre os mundos, graduados de acordo com a natureza dos Espíritos que podem atingi-los, e que neles gozam de maior ou menor bem-estar.

      234 – a) Os Espíritos que habitam esses mundos podem deixá-los à vontade?

     — Sim, os Espíritos que se encontram nesses mundos podem deixá-los, para seguir o seu destino. Figurai-os como aves de arribação descendo numa ilha, para recuperarem suas forças e seguirem avante.

      235. Os Espíritos progridem durante essas estações nos mundos transitórios?

      — Certamente. Os que assim se reúnem têm o fito de se instruírem e poder mais facilmente obter a permissão de ir a lugares melhores até chegar à posição dos eleitos.

      236. Os mundos transitórios são, por sua natureza especial, perpetuamente destinados aos Espíritos errantes?

      — Não, sua posição é apenas temporária.

      236 – a) São eles ao mesmo tempo habitados por seres corpóreos?

      — Não, sua superfície é estéril. Os que os habitam não precisam de nada.

      236 – b) Essa esterilidade é permanente e se liga à sua natureza especial?

      — Não; são estéreis transitoriamente.

      236 – c) Esses mundos seriam, então, desprovidos de belezas naturais?

      — A Natureza se traduz, pelas belezas da imensidade, que não são menosadmiráveis do que as que chamais belezas naturais.

      236 – d) Sendo transitório o estado desses mundos, a Terra terá um dia de estar entre eles?

      — Já esteve.

       236. e) Em que época?

      — Durante a sua formação.

Comentário de Kardec: Nada existe de inútil na Natureza: cada coisa tem a sua finalidade, a sua destinação; nada é vazio, tudo é habitado, a vida se expande por toda parte. Assim, durante a longa série de séculos que se escoou antes da aparição do homem sobre a Terra, durante os lentos períodos de transição atestados pelas camadas geológicas, antes mesmo da formação dos primeiros seres orgânicos, sobre essa massa informe, nesse árido caos em que os elementos se confundiam, não havia ausência de vida. Seres que não tinham as nossas necessidades, nem as nossas sensações físicas, ali encontravam refúgio. Deus quis que, mesmo nesse estado imperfeito, ela servisse para alguma coisa. Quem, pois, ousaria dizer que, entre os bilhões de mundos que circulam na imensidade, apenas um, e um dos menores, perdido na multidão, teve o privilégio exclusivo de ser povoado? Qual seria a utilidade dos outros? Deus só os teria feito para recrear os nossos olhos? Suposição absurda, incompatível com a sabedoria que brilha em todas as suas obras, inadmissíveis quando se pensa em todas as que não podemos perceber. Ninguém poderá negar que há, nesta idéia dos mundos ainda impróprios para a vida material, e, entretanto, povoados de seres apropriados ao seu estado, alguma coisa de grande e sublime, onde talvez se encontre a solução de mais de um problema.

 

      237. A alma, uma vez no mundo dos Espíritos, tem ainda as percepções que tinha nesta vida?

      — Sim, e outras que não possuía, porque o seu corpo era como um véu que a obscurecia. A inteligência é um atributo do Espírito, mas se manifesta mais livremente quando não tem entraves.

      238. As percepções e os conhecimentos dos Espíritos são ilimitados? Sabem eles todas as coisas?

      — Quanto mais se aproximam da perfeição, mais sabem; se são superiores, sabem muito. Os Espíritos inferiores são mais ou menos ignorantes em todos os assuntos.

      239. Os Espíritos conhecem o princípio das coisas?

      — Conforme a sua elevação e a sua pureza. Os Espíritos inferiores não sabem mais do que os homens.

       240. Os Espíritos compreendem a duração como nós?

       — Não; e isso faz que não nos compreendamos sempre quando se trata de fixar datas ou épocas.

 Comentário de Kardec: Os Espíritos vivem fora do tempo, tal como o compreendemos; a duração, para eles, praticamente não existe, e os séculos, tão longos para nós, são aos seus olhos apenas instantes que desaparecem na eternidade, da mesma maneira que as desigualdades do solo se apagam e desaparecem, para aquele que se eleva no espaço.

       241. Os Espíritos fazem do presente uma idéia mais precisa e mais justa do que nós?

       — Mais ou menos como aquele que vê claramente tem uma idéia mais justa das coisas do que o cego. Os Espíritos vêem o que não vedes, e julgam diferente de vós. Mas ainda uma vez.: isso depende da sua elevação.

       242. Como têm os Espíritos o conhecimento do passado? Esse conhecimento é para eles ilimitado?

       — O passado, quando dele nos ocupamos, é um presente, precisamentecomo te lembras de uma coisa que te impressionou durante o teu exílio.Entretanto, como não temos mais o véu material que obscurece a tua inteligência, lembramo-nos das coisas que desapareceram para ti. Mas nem tudo os Espíritos conhecem, a começar pela sua própria criação.

      243. Os Espíritos conhecem o futuro?

      — Depende, ainda, da sua perfeição. Quase sempre, nada mais fazem do que entrevê-lo, mas nem sempre têm a permissão de o revelar. Quando o vêem, ele lhes parece presente. O Espírito vê o futuro mais claramente, à medida que se aproxima de Deus. Depois da morte, a alma vê e abarca de relance as suas migrações passadas, mas não pode ver o que Deus lhe prepara. Para isso, é necessário que esteja integrada nele, depois de muitas existências.

      243 – a) Os Espíritos chegados à perfeição absoluta têm completo conhecimento do futuro?

      — Completo não é o termo, porque Deus é o único e soberano Senhor eninguém o pode igualar.

      244. Os Espíritos vêem a Deus?

      — Somente os Espíritos superiores o vêem e compreendem; os Espíritosinferiores o sentem e adivinham.

      244. a) Quando um Espírito inferior diz que Deus lhe proíbe ou permite uma coisa, como sabe que a ordem vem de Deus?

      — Ele não vê a Deus, mas sente a sua soberania, e quando uma coisa não deve ser feita ou uma palavra não deve ser dita, recebe uma intuição, uma advertência invisível, que o inibe de fazê-lo. Vós mesmos tendes pressentimentos que são para vós como advertências secretas, para fazerdes ou não alguma coisa. O mesmo acontece conosco mas em grau superior, pois compreendes que, sendo mais sutil do que a vossa a essência dos Espíritos, eles podem receber mais facilmente as advertências divinas.

      244. b) A ordem é transmitida diretamente por Deus, ou por intermédio de outros Espíritos?

      — Não vem diretamente de Deus, pois para comunicar-se com ele é preciso merecê-lo. Deus transmite as suas ordens pêlos Espíritos que estão mais elevados em perfeição e instrução.

      245. A vista dos Espíritos é circunscrita, como nos seres corpóreos?

      — Não, é uma faculdade geral.

      246. Os Espíritos precisam de luz para ver?

      — Vêem pela luz própria, sem necessidade de luz exterior. Para eles não há trevas, a não ser aquelas em que podem encontrar-se por expiação.

      247. Os Espíritos precisam transportar-se, para ver em dois lugares diferentes? Podem ver ao mesmo tempo num e noutro hemisfério do globo?

      — Como o Espírito se transporta com a rapidez do pensamento, podemosdizer que vê por toda parte de uma só vez. Seu pensamento pode irradiai dirigir-se para muitos pontos ao mesmo tempo. Mas essa faculdade depende da sua pureza: quanto menos puro ele for, mais limitada é a sua vista; somente os Espíritos superiores podem ter visão de conjunto.

Comentário de Kardec: A faculdade de ver dos Espíritos, inerente à sua natureza, difunde-se por todo seu ser, como a luz num corpo luminoso. É uma espécie de lucidez universal, que estende a tudo, envolve simultaneamente o espaço, o tempo e as coisas e par; qual não há trevas nem obstáculos materiais. Compreende-se que assim deve ‘ pois no homem a vista funciona através de um órgão que recebe a luz, e sem luz fica na obscuridade. Nos Espíritos, a faculdade de ver é um atributo próprio, que independe de qualquer agente exterior. Avista não precisa da luz. (Ver Ubiqüidade item 92.)

      248. O Espírito vê as coisas distintamente como nós?

      — Mais distintamente, porque a sua vista penetra o que a vossa não pode penetrar; nada a obscurece.

      249. O Espírito percebe os sons?

      — Sim, e percebe até mesmo os que os vossos sentidos obtusos não podem perceber.

      249 – a) A faculdade de ouvir, como a de ver, está em todo o seu ser?

      — Todas as percepções são atributos do Espírito e fazem parte do seu ser. Quando ele se reveste de corpo material, elas se manifestam pelos me orgânicos; mas, no estado de liberdade, não estão mais localizadas.

      250. Sendo as percepções atributos do próprio Espírito, ele pode deixar de usá-las?

      — O Espírito só vê e ouve o que ele quiser. Isto de uma maneira geral, e sobretudo para os Espíritos elevados. Os imperfeitos ouvem e vêemfreqüentemente, queiram ou não, aquilo que pode ser útil ao seu melhoramento.

      251. Os Espíritos são sensíveis à música?

      — Trata-se da vossa música? O que é ela perante a música celeste, essaharmonia da qual ninguém na Terra pode ter idéia? Uma é para a outra o  que o canto do selvagem é para a suave melodia. Não obstante, os Espíritos vulgares podem provar um certo prazer ao ouvir a vossa música, porque não estão ainda capazes de compreender outra mais sublime. A música tem, para os Espíritos, encantos infinitos, em razão de suas qualidades sensitivas muito desenvolvidas. Refiro-me à música celeste, que é tudo quanto a imaginar espiritual pode conceber de mais belo e mais suave.

       252. Os Espíritos são sensíveis às belezas naturais? 

       — As belezas naturais dos vários globos são tão diversas que estamos longe de as conhecer. Sim, são sensíveis a elas segundo as suas aptidões para as apreciar e compreender. Para os Espíritos elevados, há belezas de conjunto diante das quais se apagam, por assim dizer, as belezas dos detalhes.

       253. Os Espíritos experimentam as nossas necessidades e os nossos  sofrimentos físicos?

       — Eles os conhecem, porque os sofreram, mas não os experimentam como vós, porque são Espíritos.

       254. Os Espíritos sentem fadiga e necessidade de repouso?

       — Não podem sentir a fadiga como a entendeis, e, portanto não necessitam do repouso corporal, pois não possuem órgãos em que as forças tenham de ser restauradas. Mas o Espírito repousa, no sentido de não permanecer numa atividade constante. Ele não age de maneira material porque a sua ação é toda intelectual e o seu repouso é todo moral.  Há momentos em que o seu pensamento diminui de atividade e não se dirige a um objetivo determinado; este é um verdadeiro repouso, mas não se pode compará-lo ao do corpo. A espécie de fadiga que os Espíritos podem provar esta na razão da sua inferioridade, pois quanto mais se elevam, de menos repouso necessitam.

      255. Quando um Espírito diz que sofre, de que natureza é o seu sofrimento?

      — Angústias morais, que o torturam mais dolorosamente que os sofrimentos físicos.

      256. Como alguns Espíritos se queixam de frio ou calor?

      — Lembrança do que sofreram durante a vida e algumas vezes tão penosa como a própria realidade. Freqüentemente, é uma comparação que fazem, para exprimirem a sua situação. Quando se lembram do corpo experimentam uma espécie de impressão, como quando se tira uma capa e algum tempo depois ainda se pensa estar com ela.

 

      258. No estado errante, antes de nova existência corpórea, o Espírito tem consciência e previsão do que lhe vai acontecer durante a vida?

      — Ele mesmo escolhe o gênero de provas que deseja sofrer; nisto consiste o seu livre-arbítrio.

      258. A) Não é Deus quem lhe impõe as tribulações da vida, como castigo?

      — Nada acontece sem a permissão de Deus, porque foi ele quem estabeleceu todas as leis que regem, o Universo. Perguntareis agora por que ele fez tal lei em vez de tal outra! Dando ao Espírito a liberdade de escolha, deixa-lhe toda a responsabilidade dos seus atos e das suas conseqüências; nada lhe estorva o futuro; o caminho do bem está à sua frente, como o do mal. Mas se sucumbir, ainda lhe resta uma consolação, a de que nem tudo se acabou para ele, pois Deus, na sua bondade, permite-lhe recomeçar o que foi malfeito. É necessário distinguir o que é obra da vontade de Deus e o que é da vontade do homem. Se um perigo vos ameaça, não fostes vós que o criastes, mas Deus; tivestes, porém, a vontade de vos expordes a ele, porque o considerastes um meio de adiantamento; e Deus o permitiu.

       259. Se o Espírito escolhe o gênero de provas que deve sofrer, todas as tribulações da vida foram previstas e escolhidas por nós?

       — Todas, não, pois não se pode dizer que escolhestes e previstes tudo o que vos acontece no mundo, até as menores coisas. Escolhestes o gênero de provas; os detalhes são conseqüências da posição escolhida, e freqüentemente de vossas próprias ações. Se o Espírito quis nascer entre malfeitores, por exemplo, já sabia a que deslizes se expunha, mas não conhecia cada um dos atos que praticaria; esses atos são produtos de sua vontade ou do seu livre-arbítrio. O Espírito sabe que, escolhendo esse caminho, terá de passar por esse gênero de lutas; e sabe de que natureza são as vicissitudes que irá encontrar; mas não sabe quais os acontecimentos que o aguardam. Os detalhes nascem das circunstâncias e da força das coisas. Só os grandes acontecimentos, aqueles que influem no destino, estão previstos. Se tomas um caminho cheio de desvios, sabes que deves ter muitas precauções, porque corres o perigo de cair, mas não sabes quando cairás, e pode ser que nem caias, se fores bastante prudente. Se, ao passar pela rua, uma telha te cair na cabeça, não penses que estava escrito, como vulgarmente se diz.

      260. Como o Espírito pode querer nascer entre gente de má vida?

      — E necessário ser enviado ao meio em que possa sofrera prova pedida. Pois bem, o semelhante atrai o semelhante, e para lutar contra o instinto do bandido é preciso que ele se encontre entre gente dessa espécie.

      260 – a) Se não houvesse gente de má vida na Terra, o Espírito não poderia encontrar nela o meio necessário a certas provas?

      — E deveríamos lamentar isso ? É o que acontece nos mundos superiores, onde o mal não tem acesso. É por isso que neles só existem bons Espíritos. Fazei que o mesmo aconteça, bem logo, em vossa Terra.

      261. O Espírito, nas provas que deve sofrer para chegar à perfeição, terá de experimentar todos os gêneros de tentações? Deverá passar por todas as circunstâncias que possam provocar-lhe o orgulho, o ciúme, a avareza, a sensualidade etc.?

      — Certamente não, pois sabeis que há os que tomam desde o princípio um caminho que os afasta de muitas provas. Mas aquele que se deixa levar pelo mau caminho, corre todos os perigos do mesmo. Um Espírito pode pedir a riqueza e esta lhe será dada; então, segundo o seu caráter, poderá tornar-se avarento ou pródigo, egoísta ou generoso, ou ainda entregar-se a todos os prazeres da sensualidade. Mas isso não quer dizer que ele devia passar forçosamente por todas essas tendências.

      262. Como pode o Espírito que, em sua origem, é simples, ignorante e sem experiência escolher uma existência com conhecimento de causa e ser responsável pela sua escolha?

      — Deus supre a sua inexperiência, traçando-lhe o caminho que deve seguir, como fazes com uma criança desde o berço. Mas deixa-lhe pouco a pouco a liberdade de escolher, à medida que o seu livre-arbítrio se desenvolve. E então que ele muitas vezes se extravia, tomando o mau caminho, por não ouvir os conselhos dos bons Espíritos. É a isso que podemos chamar a queda do homem.

       262 – a) Quando o Espírito goza do seu livre-arbítrio, a escolha da existência corpórea depende sempre exclusivamente da sua vontade ou essa existência pode lhe ser imposta pela vontade de Deus, como expiação?

       -Deus sabe esperar: não precipita a expiação. Entretanto, pode impor certa existência a um Espírito, quando este, por sua inferioridade ou má vontade, não está apto a compreender o que lhe seria mais proveitoso, e quando vê que essa existência pode servir para a sua purificação, o seu adiantamento, e ao mesmo tempo servir-lhe de expiação.

       263. O Espírito faz a escolha imediatamente após a morte?

       - Não, pois muitos crêem na eternidade das penas e, como já vos foi dito, isso é um castigo.

       264. O que orienta o Espírito na escolha das provas?

       - Ele escolhe as que podem servir de expiação, segundo a natureza de suas faltas, e fazê-lo adiantar mais rapidamente. Uns podem impor-se uma vida de misérias e provações para tentar suportá-la com coragem outros querem experimentar as tentações da fortuna e do poder, bem mais perigosas pelo abuso e o mau emprego que se lhes pode dar e pelas más paixões que desenvolvem; outros, enfim, querem ser provados nas lutas que terão de sustentar no contato com o vicio.

      265. Se alguns dos Espíritos escolhem o contato com o vício como prova, há os que o escolhem por simpatia e pelo desejo de viver num meio adequado aos seus gostos, ou para poderem entregar-se livremente às suas inclinações materiais?

      — Há, por certo, mas só entre aqueles cujo senso moral é ainda poucodesenvolvido; a prova decorre disso, e eles a sofrem por tempo mais longo Cedo ou tarde, compreenderão que a satisfação das paixões brutais tem para eles conseqüências deploráveis, que terão de sofrer durante um tempo que lhes parecerá eterno. Deus poderá deixá-los nesse estado até que eles tenhamcompreendido suas faltas, pedindo por si mesmos o meio de resgatá-las emprovas proveitosas.

      266. Não parece natural que os Espíritos escolham as provas menos penosas?

     - Para vós, sim; para o Espírito, não. Quando ele está liberto da matéria, cessa a ilusão, e a sua maneira de pensar é diferente

Comentário de Kardec: O homem, submetido na Terra à influência das idéias carnais, só vê nas suas provas o lado penoso. É por isso que lhe parece natural escolher as que, do seu ponto de vista, podem subsistir com os prazeres materiais. Mas na vida espiritual ele compara os prazeres fugitivos e grosseiros com a felicidade inalterável que entrevê, e então, que lhe importam alguns sofrimentos passageiros? O Espírito pode escolher a prova mais rude, e em conseqüência a existência mais penosa, com a esperança de chegar mais depressa a um estado melhor, como o doente escolhe muitas vezes o remédio mais desagradável, para se curar mais rapidamente. Aquele que deseja ligar o seu nome à descoberta de um país desconhecido, não escolhe um caminho coberto de flores, pois sabe os perigos que corre, mas sabe também a glória que o espera, se for feliz.

       A doutrina da liberdade de escolha das nossas existências e das provas que devemos sofrer deixa de parecer extraordinária, quando se considera que os Espíritos, libertos da matéria, apreciam as coisas de maneira diferente da nossa. Eles antevêem o fim, e esse fim lhes parece muito mais importante que os prazeres fugidios do mundo. Depois de cada existência, vêem o progresso que fizeram e compreendem quanto ainda lhes falta em pureza, para o atingirem. Eis porque se submetem voluntariamente a todas as vicissitudes da vida corpórea, pedindo eles mesmos aquelas que podem fazê-los chegar mais depressa. Não há, pois, motivo para nos admirarmos de que o Espírito não dê preferência à existência mais suave. No seu estado de imperfeição, ele não pode desfrutar a vida sem amarguras, que apenas entrevê. E é para atingi-la que procura melhorar-se.

       Não vemos diariamente exemplos de coisas parecidas? O homem que trabalha uma parte de sua vida, sem tréguas nem descanso, a fim de ajuntar o necessário para o seu bem-estar. não desempenha uma tarefa que se impôs, com vistas a um futuro melhor? O militar que se oferece para uma missão perigosa, o viajante que não enfrenta menores perigos, no interesse da Ciência ou de sua própria fortuna, não se submetem a provas voluntárias, que devem proporcionar-lhes honra e proveito, se as vencerem? A que o homem não se submete e não se expõe, pelo seu interesse ou pela sua glória? Todos os concursos não são provas voluntárias para melhorar na carreira escolhida? Não se chega a nenhuma posição social de elevada importância, nas ciências, nas artes, na indústria, sem passar pela série de posições inferiores, que são outras tantas provas. A vida humana é, assim, o decalque da vida espiritual. Nela encontramos, em menor escala, todas as peripécias daquela. Se na vida terrena escolhemos muitas vezes as provas mais difíceis, com vistas a um fim mais elevado, por que o Espírito, que vê mais longe, e para quem a vida do corpo é apenas um incidente fugaz, não escolherá uma existência penosa e laboriosa, se ela o deve conduzir a uma felicidade eterna? Aqueles que dizem que, se pudessem escolher a sua existência, teriam pedido a de príncipes ou milionários, são como os míopes que não vêem o que tocam, ou como as crianças gulosas, que respondem, quando  perguntamos que profissão preferem: pasteleiros ou confeiteiros.

         Da mesma maneira, o viajante, no fundo de um vale nevoento, não vê a extensão nem os pontos extremos da sua rota; mas, chegando ao cume da montanha, seu olhar abrange o caminho percorrido e o que falta percorrer, vê o final de sua  viagem, os obstáculos que ainda tem de vencer, e pode então escolher com mais segurança os meios de o atingir. O Espírito encarnado é como o viajante no fundo do vale; desembaraçado dos liames terrestres, é como o que atingiu o cume. Para o viajante, o fim é o repouso após a fadiga; para o Espírito, é a felicidade suprema, após as tribulações e as provas.

      Todos os Espíritos dizem que, no estado errante, buscam, estudam, observam, para fazerem suas escolhas. Não temos um exemplo disso na vida corpórea? Não buscamos muitas vezes, através dos anos, a carreira que livremente acabamos por escolher, porque a achamos a mais apropriada aos nossos objetivos? Se fracassamos numa, procuramos outra. Cada carreira que abraçamos é uma fase, um período da vida. Não empregamos cada dia em escolher o que faremos no outro? Ora, o que são as diferentes existências corpóreas para o Espírito, senão fases, períodos, dias da sua vida espírita que. como sabemos, é a vida normal, não sendo a vida corpórea mais do que transitória, passageira?

      267. O Espírito poderia fazer a sua escolha durante a vida corporal?

      — Seu desejo pode ter influência. Isso depende da intenção. Mas, no estado de Espírito, freqüentemente vê as coisas de maneira diferente. É o Espírito quem faz a escolha. Mas, ainda assim, ele pode fazê-la nesta vida material, porque o Espírito tem sempre os momentos em que se liberta da matéria.

      267 – a) Muitas pessoas desejam grandezas e riquezas, mas não o será, por certo, como expiação nem como prova?

      — Sem duvida; a matéria deseja essa grandeza, para gozá-la, e o Espírito a deseja, para conhecer-lhe as vicissitudes.

      268. Até que chegue ao estado de perfeita pureza, o Espírito tem de passar constantemente por provas?

      — Sim, mas elas não são como as entendeis. Chamais provas às tribulações materiais; ora, o Espírito, chegando a um certo grau, mesmo sem ser perfeito, não tem mais nada a sofrer. Mas tem sempre deveres que o ajudam a se aperfeiçoar, e que não são penosas para ele, a não ser os de ajudar os outros a se aperfeiçoarem.

      269. O Espírito pode enganar-se, quanto à eficácia da prova que escolher?

      — Pode escolher uma que esteja acima de suas forças, e então sucumbe.Pode também escolher uma que não lhe dê proveito algum, como um gênero de vida ocioso e inútil. Mas, nesse caso, voltando ao mundo dos Espíritos, percebe que nada ganhou, e pede para recuperar o tempo perdido.

      270. Ao que se devem as vocações de certas pessoas e sua vontade de seguir uma carreira em vez de outra?

       — Parece-me que podeis responder por vós mesmos a esta questão. Não é a conseqüência de tudo o que dissemos sobre a escolha das provas sobre o progresso realizado numa existência anterior?

       271.Quando o Espírito estuda, na erraticidade, as diversas condições em que poderá progredir, como julga poder fazê-lo, se nascer entre canibais?

       — Não são os Espíritos já adiantados que nascem entre os canibais, mas os Espíritos da mesma natureza dos canibais, ou que lhes são inferiores.

Comentário de Kardec:  Sabemos que os nossos antropófagos não estão no último grau da escala, e que há mundos onde o embrutecimento e a ferocidade ultrapassam tudo o que  existe na Terra. Esses Espíritos são, portanto, ainda inferiores aos mais inferiores do nosso mundo, e vir para o meio dos nossos selvagens é para eles um progresso, como seria um progresso para os nossos antropófagos exercer entre nós uma profissão que não os obrigasse a derramar sangue. Se eles não visam a mais alto, é porque a sua inferioridade moral não lhes permite compreender um progresso mais completo. O Espírito não pode avançar senão gradualmente; não pode transpor de um salto a distância que separa a barbárie da civilização. E está nisso uma necessidade da reencarnação. que se mostra verdadeiramente de acordo com a justiça de Deus. De outra maneira, em que se transformariam esses milhões de seres que morrem diariamente no último estado de degradação, se não tivessem meios de se elevar? Por que Deus os teria deserdado dos favores concedidos aos demais?

      272. Os Espíritos procedentes de um mundo inferior à Terra, ou de um povo muito atrasado, como os canibais, poderiam nascer entre os povos civilizados?

      — Sim, há os que se extraviam ao quererem subir muito alto, mas ficamdeslocados entre vós, porque têm hábitos e instintos que se chocam com osvossos.

Comentário de Kardec:   Esses seres nos dão o triste espetáculo da ferocidade em meio da civilização. Retornando para o meio dos canibais, isso não será um retrocesso, pois não farão mais do que retomar o seu lugar e talvez ainda com proveito.

      273. Um homem pertencente a uma raça civilizada poderia, por expiação, reencarnar-se num raça selvagem?

      — Sim, mas isso depende do gênero da expiação. Um senhor que tenha sido duro para os seus escravos poderá tornar-se escravo e sofrer os maus tratos que infligiu a outrem. Aquele que mandou numa época, pode, em outra existência, obedecer aos que se curvaram ante a sua vontade. É uma expiação, se ele abusou do poder, e Deus pode determiná-la. Um bom Espírito pode, para os fazer avançar, escolher uma vida de influência entre esses povos. Então se trata de uma missão.

 

      274. As diferentes ordens de Espíritos estabelecem entre elas uma hierarquia de poderes; e há entre eles subordinação e autoridade?

      — Sim, muito grande. Os Espíritos têm, uns sobre os outros, a autoridaderelativa à sua superioridade. E a exercem por meio de uma ascendência moralirresistível.

      274 – a) Os Espíritos inferiores podem subtrair-se à autoridade dos superiores?

      — Eu disse: irresistível.

      275. O poder e a consideração de que um homem goza na Terra dão-lhe alguma supremacia no mundo dos Espíritos?

      — Não; pois os pequenos serão elevados e os grandes, rebaixados. Lê os salmos.

      275 – a) Como devemos entender essa elevação e esse rebaixamento?

      — Não sabes que os Espíritos são de diferentes ordens, segundo os seusméritos? Pois bem, o maior na Terra pode estar na última classe entre osEspíritos; enquanto o seu servidor estará na primeira. Compreendes isso? Jesus não disse: Quem se humilhar será exaltado e quem se exaltar será humilhado?

      276. Aquele que foi grande na Terra e se encontra inferior entre os Espíritos sente humilhação?

      — Quase sempre muito grande, sobretudo se era orgulhoso e invejoso.

       277. O soldado que, após a batalha, encontra o seu general no mundo dos Espíritos, reconhece-o ainda como seu superior?

      — O título não é nada; a superioridade real é tudo.

      278. Os Espíritos de diferentes ordens estão misturados?

      — Sim e não; quer dizer, eles se vêem, mas se distinguem uns dos outros.Afastam-se ou se aproximam segundo a semelhança ou divergência de seussentimentos, como acontece entre vós. E todo um mundo, do qual o vosso é o reflexo obscuro. Os da mesma ordem se reúnem por uma espécie de afinidade, e formam grupos ou famílias de Espíritos unidos pela simpatia e pelos propósitos; os bons, pelo desejo de fazer o bem; os maus, pelo desejo de fazer o mal, pela vergonha de suas faltas e pela necessidade de se encontrarem entre os seres semelhantes a eles.

 Comentário de Kardec:    Igual a uma grande cidade, onde os homens de todas as classes e de todas as condições se vêem e se encontram, sem se confundirem, onde as sociedades se formam pela similitude de gostos, onde o vicio e a virtude se acotovelam, sem se falarem.

      279. Todos os Espíritos têm acesso, reciprocamente, uns junto aos outros?

      — Os bons vão por toda parte e é necessário que assim seja, para quepossam exercer a sua influência sobre os maus. Mas as regiões habitadas pelos bons são interditadas aos imperfeitos, afim de que não levem a elas o distúrbio das más paixões.

      280. Qual é a natureza das relações entre os bons e os maus Espíritos?

      — Os bons procuram combater as más tendências dos outros, a fim de os ajudar a subir; e uma missão.

      281. Por que os Espíritos inferiores se comprazem em nos levar ao mal?

      — Pelo despeito de não terem merecido estar entre os bons. Seu desejo é o de impedir, tanto quanto puderem, que os Espíritos ainda inexperientes atinjam o bem supremo. Querem fazer os outros provarem aquilo que eles provam. Não vedes o mesmo entre vós ?

      282. Como os Espíritos se comunicam entre si?

      — Eles se vêem e se compreendem; a palavra é material: é o reflexo dafaculdade espiritual. O fluido universal estabelece entre eles uma comunicaçãoconstante; é o veículo da transmissão do pensamento, como o ar é para vós oveículo do som; uma espécie de telégrafo universal que liga todos os mundos,permitindo aos Espíritos corresponderem-se de um mundo a outro.

      283. Os Espíritos podem dissimular reciprocamente os seus pensamentos; podem esconder-se uns dos outros?

      — Não; para eles, tudo permanece a descoberto, principalmente quando são perfeitos. Podem distanciar-se uns dos outros, mas sempre se vêem. Esta não é uma regra absoluta, porque certos Espíritos podem muito bem tornar-se invisíveis para outros, se julgam útil fazê-lo.

      284. Como podem os Espíritos, que não têm mais corpo, constatar a própria individualidade e distinguir-se dos outros que os rodeiam?

      — Constatam a sua individualidade pelo períspirito, que os torna seresdistintos uns para os outros, como os corpos entre os homens.

      285. Os Espíritos se reconhecem por terem convivido na Terra? O filho reconhece o pai; o amigo, o seu amigo?

      — Sim, e assim de geração a geração.

      285 – a) Como se reconhecem no mundo dos Espíritos os homens que se conheceram na Terra?                       

      — Vemos a nossa vida passada e a lemos como num livro. Vendo o passado de nossos amigos e de nossos inimigos, vemos a sua passagem da vida para a morte.

      286. A alma, ao deixar os despojos mortais, vê imediatamente os parentes e amigos que a precederam no mundo dos Espíritos?

      —Imediatamente, nem sempre; pois, como já dissemos, é-lhe necessárioalgum tempo para reconhecer o seu estado e sacudir o véu material.

      287. Como a alma é recebida, na sua volta ao mundo dos Espíritos?

      —A do justo, como um irmão bem-amado e longamente esperado; a do mau, como um ser que se desprega.

      288. Que sentimento experimentam o Espíritos impuros, à vista de outro mau Espírito que chega?

      — Os maus ficam satisfeitos de verem os seres à sua imagem e como eles privados da felicidade infinita; como acontece, na Terra, a um ladrão entre os seus iguais.

      289. Nossos parentes e nossos amigos vêm, às vezes, ao nosso encontro, quando deixamos a Terra?

      — Sim, vêm ao encontro da alma que estimam, felicitam-na como noregresso de uma viagem, se ela escapou aos perigos do caminho, e a ajudam a se desprender dos liames corporais. E um favor concedido aos bons Espíritos,quando os que os amam vêm ao seu encontro, enquanto os que estão manchados ficam no isolamento ou cercados somente de Espíritos semelhantes a eles: é uma punição.

      290. Os parentes e os amigos reúnem-se sempre após a morte?

      — Isso depende de sua elevação e do caminho que seguem para o seuadiantamento. Se um deles está mais adiantado e marcha mais rápido que ooutro, não poderão ficar juntos; poderão ver-se algumas vezes, mas não estarão sempre reunidos, a não ser quando possam marchar ombro a ombro, ou quando tiverem atingido a igualdade na perfeição. Além disso, a privação de ver os parentes e amigos é às vezes uma punição

 

      291. Além da simpatia geral, determinada pelas semelhanças, há afeições particulares entre os Espíritos?

      — Sim, como entre os homens. Mas o liame que une os Espíritos é mais forte na ausência do corpo, porque não está mais exposto às vicissitudes das paixões.

      292. Há aversões entre os Espíritos?

      — Não há aversões senão entre os Espíritos impuros, e são estes que excitam entre vós as inimizades e as dissensões.

      293. Dois seres que foram inimigos na Terra conservarão os seus ressentimentos no mundo dos Espíritos?

      — Não; compreenderão que sua dissensão era estúpida e o motivo, pueril. Apenas os Espíritos imperfeitos conservam uma espécie de animosidade, até que se purifiquem. Se não foi senão um interesse material o que os separou, não pensarão mais nele por pouco desmaterializados que estejam. Se não houver antipatia entre eles, o motivo da dissensão não mais existindo, podem rever-se com prazer.

Comentário de Kardec:  Da mesma maneira que dois escolares, chegando à idade da razão, reconhecem a puerilidade de suas brigas infantis e deixam de se malquerer.

      294. A lembrança das más ações que dois homens cometeram, um contra o outro, é obstáculo à sua simpatia?

      — Sim, ela os leva a se distanciarem.

      295. Que sentimento experimentam, após a morte, aqueles a quem fizemos mal neste mundo?

      — Se são bons, perdoam, de acordo com o vosso arrependimento. Se são maus, podem conservar o ressentimento, e por vezes vos perseguir até numa outra existência. Deus pode permiti-lo, como um castigo.

      296. As afeições dos Espíritos são suscetíveis de alteração?

      — Não, porque eles não podem enganar-se, não usam mais a máscara

 sob a qual se ocultam os hipócritas, e é por isso que as suas afeições sãoinalteráveis, quando eles são puros. O amor que os une é para eles fonte de uma suprema felicidade.

      297. A afeição que dois seres mantiveram na Terra prossegue sempre no mundo dos Espíritos?

      — Sim, sem dúvida, se ela se baseia numa verdadeira simpatia: mas se  as causas de ordem física tiverem maior influência que a simpatia, ela cessa com as causas. As afeições, entre os Espíritos, são mais sólidas e mais duráveis que na Terra, porque não estão subordinadas ao capricho dos interesses materiais e do amor-próprio.

       298. As almas que se devem unir estão predestinadas a essa união desde a sua origem, e cada um de nós tem, em alguma parte do Universo,a sua  metade, à qual algum dia se unirá fatalmente?

       — Não; não existe união particular e fatal entre duas almas. A união existe entre os Espíritos, mas em graus diferentes, segundo a ordem que ocupam, ou seja, de acordo com a perfeição que adquiriram: quanto mais perfeitos, tanto mais unidos. Da discórdia nascem todos os males humanos; da concórdia resulta felicidade completa.

      299. Em que sentido se deve entender a palavra metade, de que certos Espíritos se servem para designar os Espíritos simpáticos?

      —A expressão é inexata; se um Espírito fosse a metade de outro, quando separado estaria incompleto.

      300. Dois Espíritos perfeitamente simpáticos quando reunidos ficarão assim pela eternidade ou podem separar-se e unir-se a outros Espíritos?

      — Todos os Espíritos são unidos entre si. Falo dos que já atingiram aperfeição. Nas esferas inferiores, quando um Espírito se eleva, já não tem a mesma simpatia pêlos que deixou.

      301. Dois Espíritos simpáticos são o complemento um do outro, ou essa  simpatia é o resultado de uma afinidade perfeita?

      — A simpatia que atrai um Espírito para outro é o resultado da perfeitaconcordância de suas tendências, de seus instintos; se um. devesse completar o outro, perderia a sua individualidade.

      302. A afinidade necessária para a simpatia perfeita consiste apenas na semelhança dos pensamentos e sentimentos, ou também na uniformidade dos conhecimentos adquiridos?

      — Na igualdade dos graus de elevação.

      303. Os Espíritos que hoje não são simpáticos podem sê-lo mais tarde?

      — Sim, todos o serão. Assim, o Espírito que está numa determinada esfera inferior, quando se. aperfeiçoar, chegará à esfera em que se encontra o outro. Seu encontro se realizará mais prontamente se o Espírito mais elevado,suportando mal as provas a que se submetera, tiver permanecido no mesmoestado.

      303 – a) Dois Espíritos simpáticos podem deixar de sê-lo?

      — Certamente, se um deles é preguiçoso.

 Comentário de Kardec: A teoria das metades eternas é uma imagem que representa a união de dois Espíritos simpáticos. E uma expressão usada até mesmo na linguagem vulgar e que não deve ser tomada ao pé da letra. Os Espíritos que dela se servem não pertencem à ordem mais elevada. A esfera de suas idéias é necessariamente limitada, e exprimiram o seu pensamento pelos termos de que se teriam servido na vida corpórea É necessário rejeitar esta idéia de que dois Espíritos, criados um para o outro  devem um dia fatalmente reunir-se na eternidade, após terem permanecido separados durante um lapso de tempo mais ou menos longo.