PLURALIDADE DAS EXISTÊNCIAS
166. A alma que não atingiu a perfeição durante a vida corpórea como acaba de depurar-se?
— Submetendo-se à prova de uma nova existência.
166 – a) Como ela realiza essa nova existência? Pela sua transformação como Espírito?
— Ao se depurar, a alma sofre sem dúvida uma transformação, mas para isso necessita da prova da vida corpórea.
166 – b) A alma tem muitas existências corpóreas?
— Sim, todos nós temos muitas existências. Os que dizem o contrário querem manter-vos na ignorância em que eles mesmos se encontram; esse é o seu desejo.
166 – c) Parece resultar, desse princípio, que após ter deixado o corpo a alma toma outro. Dito de outra maneira, que ela se reencarna em novo corpo. É assim que se deve entender?
— É evidente.
167. Qual a finalidade da reencarnação?
— Expiação, melhoramento progressivo da Humanidade. Sem isso, onde estaria a justiça?
168. O número das existências corpóreas é limitado ou o Espírito se reencarna perpetuamente?
— A cada nova existência o Espírito dá um passo na sendo do progresso: quando se despojou de todas as impurezas, não precisa mais das provas da vida corpórea.
169. O número das encarnações é o mesmo para todos os Espíritos?
— Não. Aquele que avança rapidamente se poupa das provas. Não obstante, as encarnações sucessivas são sempre muito numerosas porque o progresso é quase infinito.
170. Em que se transforma o Espírito depois de sua última encarnação?
— Espírito bem-aventurado; um Espírito puro.
171. Sobre o que se funda o dogma da reencarnação?
— Sobre a justiça de Deus e a revelação, pois não nos cansamos de repetir: um bom pai deixa sempre aos filhos uma porta aberta ao arrependimento. A razão não diz que seria injusto privar para sempre da felicidade eterna daqueles cujo melhoramento não dependeu deles mesmos? Todos os homens não são filhos de Deus? Somente entre os homens egoístas é que se encontram a iniqüidade, o ódio implacável e os castigos sem perdão.
Comentário de Kardec: Todos os Espíritos também tendem a perfeição, e Deus lhes proporciona os meios de consegui-la, com as provas da vida corpórea. Mas, na sua justiça, permite-lhes realizar, em novas existências, aquilo que não puderam fazer ou acabar numa primeira prova.
Não estaria de acordo com a eqüidade, nem segundo a bondade de Deus, castigar para sempre aqueles que encontraram obstáculos ao seu melhoramento, independentemente de sua vontade, no próprio meio em que foram colocados. Se a sorte do homem fosse irrevogavelmente fixada após a sua morte, Deus não teria pesado as ações de todos na mesma balança e não os teria tratado com imparcialidade.
A doutrina da reencarnação, que consiste em admitir para o homem muitas existências sucessivas, é a única que corresponde a idéia da justiça de Deus, com respeito aos homens de condição moral interior; a única que pode explicar o nosso futuro e fundamentar as nossas esperanças, pois oferece-nos o meio de resgatarmos os nossos erros através de novas provas. A razão assim nos diz, e é o que os Espíritos nos ensinam.
O homem que tem consciência da sua inferioridade encontra na doutrina da reencarnação uma consoladora esperança. Se crê na justiça de Deus, não pode esperar que, por toda a eternidade, haja de ser igual aos que agiram melhor do que ele. O pensamento de que essa inferioridade não o deserdará para sempre do bem supremo e que ele poderá conquistá-lo através de novos esforços o ampara e lhe reanima a coragem. Qual é aquele que, no fim da sua carreira, não lamenta ter adquirido demasiado tarde uma experiência que já não pode aproveitar? Pois esta experiência tardia não estará perdida: ele a aproveitará numa nova existência.
172. Nossas diferentes existências corpóreas se passam todas na Terra?
— Não mas nos diferentes mundos. As deste globo não são as primeiras nem as últimas, mas as mais materiais e distanciadas da perfeição.
173. A cada nova existência corpórea a alma passa de um mundo a outro, ou pode viver muitas vidas num mesmo globo?
—Pode reviver muitas vezes num mesmo globo, se não estiver bastante adiantada para passar a um mundo superior.
173 – a) Podemos então reaparecer muitas vezes na Terra?
— Certamente.
173 – b) Podemos voltar a ela depois de ter vivido em outros mundos?
— Seguramente; podeis ter já vivido noutros mundos bem como na Terra.
174. É uma necessidade reviver na Terra?
— Não. Mas, se não progredirdes, podeis ir para outro mundo que não seja melhor, e que pode mesmo ser pior.
175. Há vantagem em voltar a viver na Terra?
— Nenhuma vantagem particular, a não ser que se venha em missão, pois então se progride, como em qualquer outro mundo.
175 – a) Não seria melhor continuar como Espírito?
— Não, não! Ficar-se-ia estacionário, e o que se quer é avançar para Deus.
176. Os Espíritos, depois de se haverem encarnado em outros mundos, podem encarnar-se neste, sem jamais terem passado por aqui?
— Sim, como vós em outros globos. Todos os mundos são solidários; o que não se faz num, pode-se fazer noutro.
176 – a) Assim, existem homens que estão na Terra pela primeira vez?
— Há muitos, e em diversos graus.
176 – b) Pode-se reconhecer, por um sinal qualquer, quando um Espírito se encontra pela primeira vez na Terra?
— Isso não teria nenhuma utilidade.
177. Para chegar à perfeição e à felicidade suprema, que é o objetivo final de todos os homens, o Espírito deve passar pela série de todos os mundos que existem no Universo?
— Não, porque há muitos mundos que se encontram no mesmo grau e onde os Espíritos nada aprenderiam de novo.
177 a) Como então explicar a pluralidade de sua existência num mesmo globo?
— Eles podem ali se encontrar de cada vez, em posições bastante diferentes, que serão outras tantas ocasiões de adquirir experiência.
178. Os Espíritos podem renascer corporalmente num mundo relativamente inferior àquele em que já viveram?
— Sim, quando têm uma missão a cumprir, para ajudar o progresso; e então aceitam com alegria as tribulações dessa existência porque lhes fornecem um meio de se adiantarem.
178 – a) Isso não pode também acontecer como expiação, e Deus não pode enviar os Espíritos rebeldes a mundo inferiores?
— Os Espíritos podem permanecer estacionários, mas nunca retrogradas; sua punição, pois, é a de não avançar e ter recomeçar as existências mal empregadas, no meio que convém à sua natureza.
178 – b) Quais são os que devem recomeçar a mesma existência?
— Os que faliram em sua missão ou em suas provas.
179. Os seres que habitam cada mundo estão todos no mesmo grau de perfeição?
— Não. É como na Terra: há os que estão mais ou menos adiantados.
180. Ao passar deste mundo para outro, o Espírito conserva a inteligência que tinha aqui?
— Sem dúvida, pois a inteligência nunca se perde. Mas ele pode não dispor dos mesmos meios para manifestá-la. Isso depende da sua superioridade e do estado do corpo que adquirir. (Ver influência do organismo, item 367).
181. Os seres que habitam os diferentes mundos têm corpos semelhantes aos nossos?
— Sem dúvida que têm corpos, porque é necessário que o Espírito se revista de matéria para agir sobre ela; mas esse envoltório é mais ou menos material, segundo o grau de pureza a que chegaram os Espíritos, e é isso que determina as diferenças entre os mundos que temos de percorrer. Porque há muitas moradas na casa de nosso Pai, e muitos graus, portanto. Alguns o sabem e têm consciência disso aqui na Terra, mas outros anda sabem.
182. Podemos conhecer exatamente o estado físico e moral dos diferentes mundos?
— Nós, Espíritos, não podemos responder senão na medida do vosso grau de evolução. Quer dizer que não devemos revelar estas coisas a todos, porque nem todos estão em condições de compreendê-las, e elas os perturbariam.
Comentário de Kardec: À medida que o Espírito se purifica, o corpo que o reveste, aproxima-se igualmente da natureza espírita. A matéria se torna menos densa, ele já não se arrasta penosamente pelo solo, suas necessidades físicas são menos grosseiras, os seres vivos não têm mais necessidade de se destruírem para se alimentar. O Espírito é mais livre e tem, para as coisas distanciadas, percepções que desconhecemos: vê pelos olhos do corpo aquilo que só vemos pelo pensamento.
A purificação dos Espíritos reflete-se na perfeição moral dos seres em que estão encarnados. As paixões animais se enfraquecem, o egoísmo dá lugar ao sentimento fraternal. É assim que, nos mundos superiores ao nosso, as guerras são desconhecidas, os ódios e as discórdias não têm motivo, porque ninguém pensa em prejudicar o seu semelhante. A intuição do futuro, a segurança que lhes dá uma consciência isenta de remorsos fazem que a morte não lhes cause nenhuma apreensão: eles a recebem sem medo e como uma simples transformação.
A duração da vida, nos diferentes mundos, parece proporcional ao seu grau de superioridade física e moral, e isso é perfeitamente racional. Quanto menos material é o corpo, está menos sujeito às vicissitudes que o desorganizam, quanto mais puro é o Espírito, menos sujeito às paixões que o enfraquecem. Este é ainda um auxílio da providência, que deseja, assim, abreviar os sofrimentos.
183. Passando de um mundo para outro, o Espírito passa por nova infância?
— A infância é por toda parte uma transição necessária, mas não é sempre tão ingênua como entre vós.
184. O Espírito pode escolher o novo mundo em que vai habitar?
— Nem sempre; mas pode pedir e obter o que deseja, se o merecer. Porque os mundos só são acessíveis aos Espíritos de acordo com o grau de sua elevação.
184 – a) Se o Espírito nada pede, o que determina o mundo onde irá reencarnar?
— O seu grau de elevação.
185. O estado físico e moral dos seres vivos é perpetuamente o mesmo em cada globo?
— Não; os mundos também estão submetidos à lei do progresso. Todoscomeçaram como o vosso, por um estado inferior, e a Terra mesma sofrerá uma transformação semelhante, tornando-se um paraíso terrestre, quando os homens se fizerem bons.
Comentário de Kardec: É assim que as raças que hoje povoam a Terra desaparecerão um dia e serão substituídas por seres mais e mais perfeitos. Essas raças transformadas sucederão à atual, como esta sucedeu a outras que eram mais grosseiras.
186. Há mundos em que o Espírito, deixando de viver num corpo material, só tem por envoltório o períspirito?
— Sim, e esse envoltório torna-se de tal maneira etéreo que para vós é como se não existisse; eis então o estado dos Espíritos puros.
186 – a) Parece resultar daí que não existe uma demarcação precisa entre o estado das últimas encarnações e o do Espírito puro?
— Essa demarcação não existe. A diferença se dilui pouco a pouco e se torna insensível, como a noite se dilui ante as primeiras claridades do dia.
187. A substância do períspirito é a mesma em todos os globos?
— Não; é mais eterizada em uns do que em outros. Ao passar de um para outro mundo, o Espírito se reveste da matéria própria de cada um, com mais rapidez, que o relâmpago.
188. Os Espíritos puros habitam mundos especiais ou encontram-se no espaço universal, sem estar ligados especialmente a um globo?
— Os Espíritos puros habitam determinados mundos, mas não estão confinados a eles como os homens à Terra; eles podem, melhor que os outros, estar em toda parte(1).
189. Desde o princípio de sua formação, o Espírito goza de plenitude de suas faculdades?
— Não; porque o Espírito, como o homem, tem também a sua infância. Em sua origem, os Espíritos não têm mais do que uma existência instintiva, possuindo apenas a consciência de si mesmo e de seus atos. Só pouco a pouco a inteligência se desenvolve.
190. Qual é o estado da alma em sua primeira encarnação?
— O estado da infância na vida corpórea. Sua inteligência apenas desabrocha: ela ensaia para a vida.
191. As almas dos nossos selvagens estão no estado de infância?
— Infância relativa, pois são almas já desenvolvidas, dotadas de paixões.
191 – a) As paixões, então, indicam desenvolvimento?
— Desenvolvimento, sim, mas não perfeição. São um sinal de atividade e de consciência própria; na alma primitiva, a inteligência e a vida estão em estado de germes.
Comentário de Kardec: A vida dos Espíritos, no seu conjunto, segue as mesmas fases da vida corpórea; passa gradativamente do estado de embrião ao de infância, para chegar, por uma sucessão de períodos, ao estado de adulto, que é o da perfeição, com a diferença de que nesta não existe o declínio nem a decrepitude da vida corpórea; que a sua vida, que teve um começo, não terá fim; que lhe é necessário, do nosso ponto de vista, um tempo imenso para passar da infância espírita a um desenvolvimento completo e o seu progresso realizar-se, não sobre uma esfera apenas, mas através de diversos mundos. A vida do Espírito constitui-se, assim, de uma série de existências corporais, sendo cada qual uma oportunidade de progresso, como cada existência corporal se compõe de uma série de dias. nos quais o homem adquire maior experiência e instrução. Mas, da mesma maneira que, na vida humana, há dias infrutíferos, na do Espírito, há existências corpóreas sem proveito, porque ele não soube conduzi-las.
192. Por uma conduta perfeita podemos vencer já nesta vida todos os graus e nos tornar Espíritos puros, sem passar pêlos intermediários?
— Não, pois o que o homem julga perfeito está longe da perfeição; há qualidades que ele desconhece e nem pode compreender. Pode ser tão perfeito quanto a sua natureza o permita, mas esta não é a perfeição absoluta. Da mesma maneira que uma criança, por mais precoce que seja, deve passar pela juventude antes de chegar à maturidade, e um doente deve passar pela convalescença antes de recuperar a saúde. Além disso, o Espírito deve adiantar-se em conhecimento e moralidade e, se ele não progrediu senão num sentido, é necessário que o faça no outro, para chegar ao alto da escala. Entretanto, quanto mais o homem se adianta na vida presente, menos longas e penosas serão as provas seguintes.
192 – a) O homem pode assegurar-se nesta vida uma existência futura menos cheia de amarguras?
— Sim, sem duvida, pode abreviar o caminho e reduziras dificuldades.
Somente o desleixado fica sempre no mesmo ponto.
193. Pode um homem descer em suas novas existências abaixo do que já havia atingido?
— Em sua posição social, sim; como Espírito, não.
194. A alma de um homem de bem pode animar, noutra encarnação, o corpo de um celerado?
— Não, pois ela não pode degenerar.
194 – a) A alma de um homem perverso pode transformar-se na de um homem de bem?
— Sim, se ela se arrepender, e então será uma recompensa.
Comentário de Kardec: A marcha dos Espíritos é progressiva e jamais retrógrada. Eles se elevam gradualmente na hierarquia, e não descem do plano atingido. Nas suas diferente existências corporais, podem descer como homens, mas não como Espíritos. Assim, a alma de um poderoso da Terra pode mais tarde animar um humilde artesão, e vice-versa. Porque as posições entre os homens são freqüentemente determinadas pelo inverso da elevação dos sentimentos morais. Herodes era rei. e Jesus carpinteiro.
195. A possibilidade de melhorar numa outra existência não pode levar certas pessoas a permanecerem no mau caminho, com o pensamento de que poderão corrigir-se mais tarde?
—Aquele que assim pensa não acredita em nada e a idéia de um castigo eterno não o coibiria mais, porque a sua razão a repele e essa idéia conduz, àincredulidade. Se apenas se houvessem empregado os meios racionais paraorientar os homens, não existiriam tantos céticos. Um Espírito imperfeito pode pensar como dizes, em sua vida corporal, mas, uma vez liberto da matéria, pensará de outra maneira, porque logo perceberá que calculou mal, e é então que trará, numa nova existência, um sentimento diverso. É assim que se efetiva o progresso. E eis porque tendes na Terra uns homens mais adiantados que outros. Uns já têm uma experiência que os outros ainda não tiveram, mas que adquirirão pouco a pouco. Deles depende impulsionar o próprio progresso ou retardá-lo indefinidamente.
Comentário de Kardec: O homem que se encontra numa posição má, deseja mudá-la o mais rapidamente possível. Aquele que se persuadiu de que as tribulações desta vida são a conseqüência de suas próprias imperfeições, procurará assegurar-se uma nova existência menos penosa, e este pensamento o desviará mais da senda do mal que o pensamento do fogo eterno, no qual não acredita.
196. Só podendo os Espíritos melhorar-se pelo sofrimento e as tribulações da existência corporal, segue-se que a vida material seria uma espécie de crivo ou de depurador, pelo qual devem passar os seres do mundo espírita para chegarem à perfeição?
— Sim, e bem isso. Eles melhoram através dessas provas, evitando o mal e praticando o bem. Mas somente depois de muitas encarnações ou depurações sucessivas é que atingem, num tempo mais ou menos longo, e segundo os seus esforços, o alvo para o qual se dirigem.
196 – a) E o corpo que influi sobre o Espírito, para o melhorar, ou o Espírito que influi sobre o corpo?
— Teu Espírito é tudo: teu corpo é uma veste que apodrece; eis tudo.
Comentário de Kardec: Temos, no suco da vinha, uma imagem material dos diferentes graus de depuração da alma. Ele contém o licor chamado espírito ou álcool, mas enfraquecido por grande quantidade de matérias estranhas que lhe alteram a essência, e não chega à pureza absoluta senão depois de muitas destilações, em cada uma das quais se despoja de alguma impureza. O alambique é o corpo no qual ele deve entrar para se depurar; as matérias estranhas são como o períspirito, que se purifica a si mesmo, à medida que o Espírito se aproxima da perfeição.
197. O Espírito de uma criança morta em tenra idade é tão adiantado como o de um adulto?
— As vezes bem mais, porque pode ter vivido muito mais e possuir maiores experiências, sobretudo se progrediu.
197 – a) O Espírito de uma criança pode então ser mais adiantado que o de seu pai?
— Isso é bastante freqüente; não o vedes tantas vezes na Terra?
198. O Espírito da criança que morre em tenra idade, não tendo podido fazer o mal, pertence aos graus superiores?
— Se não fez, o mal, também não fez o bem, e Deus não o afasta das provas que deve sofrer. Se é puro, não é pelo fato de ter sido criança, mas porque já se havia adiantado.
199. Por que a vida se interrompe com freqüência na infância?
— A duração da vida da criança pode ser, para o seu Espírito, o complemento de uma vida interrompida antes do termo devido, e sua morte é freqüentementeuma prova ou uma expiação para os pais.
199. A) Em que se transformam o Espírito de uma criança morta em tenra idade?
— Recomeça uma nova existência.
200. Os Espíritos têm sexo?
— Não como o entendeis, porque os sexos dependem da constituição orgânica. Há entre eles amor e simpatia, mas baseados na afinidade de sentimentos.
201. O Espírito que animou o corpo de um homem pode animar o de uma mulher, numa nova existência, e vice-versa?
— Sim, pois são os mesmos Espíritos que animam os homens e as mulheres.
202. Quando somos Espíritos, preferimos encarnar num corpo de homem ou de mulher?
— Isso pouco importa ao Espírito; depende das provas que ele tiver de sofrer.
203. Os pais transmitem aos filhos uma porção de sua alma, ou nada mais fazem do que lhes dar a vida animal, a que uma nova alma vem juntar depois a vida moral?
— Somente a vida animal, porque a alma é indivisível. Um pai estúpido pode ter filhos inteligentes, e vice-versa.
204. Desde que tivemos muitas existências, o parentesco remonta às anteriores?
— Não poderia ser de outra maneira. A sucessão das existências corpóreas estabelece entre os Espíritos liames que remontam às existências anteriores; disso decorrem freqüentemente as causas de simpatia entre vós e alguns Espíritos que vos parecem estranhos.
205. Segundo certas pessoas, a doutrina da reencarnação parece destruir os laços de família, fazendo-as remontar às existências anteriores.
— Ela os amplia, em vez de destruí-los. Baseando-se o parentesco em afeições anteriores, os laços que unem os membros de uma mesma família são menos precários. A reencarnação amplia os deveres da fraternidade, pois no vosso vizinho ou no vosso criado pode encontrar-se um Espírito que foi do vosso sangue.
205 – a) Ela diminui, entretanto, a importância que alguns atribuem à sua filiação, porque se pode ter tido como pai um Espírito que pertencia a uma outra raça, ou que tivesse vivido em condição bem diversa.
— É verdade; mas essa importância se baseia no orgulho. O que a maioria honra nos antepassados são os títulos, a classe, afortuna. Este coraria de haver tido por avô um. sapateiro honesto, e se vangloriaria de descender de um nobre debochado. Mas digam ou façam o que quiserem, não impedirão que as coisas sejam como são, porque Deus não regulou as leis da Natureza pela nossa vaidade.
206. Desde que não há filiação entre os Espíritos dos descendentes de uma mesma família, o culto dos antepassados seria uma coisa ridícula?
— Seguramente não, porque devemos sentir-nos felizes de pertencer a uma família na qual se encarnam Espíritos elevados. Embora os Espíritos não procedam uns dos outros, não têm menos afeição pelos que estão ligados a eles por laços de família, porque os Espíritos são freqüentemente atraídos a esta ou àquela família por causa de simpatias ou ligações anteriores. Mas acreditai que os Espíritos de vossos antepassados não se sentem absolutamente honrados com o culto que lhes tributais por orgulho. Seu mérito não recai sobre vós senão na medida em que vos esforçais por seguir os seus bons exemplos. Somente assim a vossa lembrança lhes pode ser, não apenas agradável, mas até mesmo útil.
Comentário de Kardec: Os Espíritos encarnam-se homens ou mulheres, porque não têm sexo. Como devem progredir em tudo, cada sexo, como cada posição social, oferece-lhes provas e deveres especiais, e novas ocasiões de adquirir experiências. Aquele que fosse sempre homem, só saberia o que sabem os homens.
207. Os pais transmitem aos filhos, quase sempre, semelhança física. Transmitem também semelhança moral?
— Não, porque se trata de almas ou Espíritos diferentes. O corpo procede do corpo, mas o Espírito não procede do Espírito. Entre os descendentes das raças, nada mais existe do que consangüinidade.
207 – a) De onde vêm as semelhanças morais que existem às vezes entre os pais e os filhos?
— São Espíritos simpáticos, atraídos pela afinidade de suas inclinações.
208. O Espírito dos pais não exerce influência sobre o do filho após o nascimento?
— Exerce, e muito, pois, como já dissemos, os Espíritos devem concorrer para o progresso recíproco. Pois bem: o Espírito dos pais tem a missão de desenvolver o dos filhos pela educação; isso é para ele uma tarefa. Se nela falhar, será culpado.
209. Por que pais bons e virtuosos têm filhos perversos? Ou se;a, por que as boas qualidades dos pais não atraem sempre, por simpatia, bons Espíritos como filhos?
— Um mau Espírito pode pedir bons pais, na esperança de que seu conselhos o dirijam por uma senda melhor, e muitas vezes Deus o atende.
210. Os pais poderão, pêlos seus pensamentos e as suas preces atrair para o corpo do filho um bom Espírito, em lugar de um Espírito inferior?
— Não. Mas podem melhorar o Espírito da criança a que deram nascimento e que lhes foi confiada. Esse é o dever; filhos maus são uma prova para os pais.
211. De onde vem a semelhança de caráter que existe freqüentemente entre os irmãos, sobretudo entre os gêmeos?
— Espíritos simpáticos, que se aproximam pela similitude de seus sentimentos eque se sentem felizes de estar juntos.
212. Nas crianças cujos corpos nascem ligados, e que têm certos órgãos comuns, há dois Espíritos, ou seja, duas almas?
— Sim, mas a sua semelhança faz que muitas vezes não vos pareçam mais do que uma.
213. Mas se os Espíritos se encarnam nos gêmeos por simpatia, de onde lhes vem a aversão que, às vezes, se nota entre eles?
— Não é uma regra que os gêmeos tenham de ser Espíritos simpáticos; Espíritos maus podem querer lutar juntos no teatro da vida.
214. Que pensar das histórias de crianças que lutam no ventre da mãe?
— Imagem! Para figurar que o seu ódio era muito antigo, fazem-no remontar à fase anterior ao nascimento. Geralmente não percebeis bem as imagens poéticas.
215. De onde vem o caráter distintivo que se observa em cada povo?
— Os Espíritos também formam famílias pela similitude de suas tendências, mais ou menos purificadas, segundo a sua elevação. Pois bem, um povo é uma grande família em que se reúnem Espíritos simpáticos. A tendência a se unirem que têm os membros dessas famílias é a origem da semelhança que determina o caráter distintivo de cada povo. Acreditas que Espíritos bons e humanos procurarão um povo duro e grosseiro? Não. Os Espíritos se simpatizam com as coletividades, como se simpatizam com os indivíduos. Procuram o seu meio.
216. O homem conserva, em suas novas existências, os traços do caráter moral das existências anteriores?
— Sim, isso pode acontecer. Mas, ao melhorar-se, ele se modifica. Sua posição social também pode não ser a mesma. Se de senhor ele se torna escravo, suas inclinações serão muito diferentes e teríeis dificuldades em reconhecê-lo. O Espírito sendo o mesmo, nas diversas encarnações, suas manifestações podem ter, de uma para outra, certas semelhanças. Estas, entretanto, serão modificadas pêlos costumes da nova posição, até que um aperfeiçoamento notável venha a mudar completamente o seu caráter, pois de orgulhoso e mau pode tornar-se humilde e humano, desde que se haja arrependido.
217. Nas suas diferentes encarnações, o homem conserva os traços do caráter físico das existências anteriores?
— O corpo é destruído e o novo corpo não tem nenhuma relação com o antigo. Entretanto, o Espírito se reflete no corpo. E embora seja apenas matéria, é modelado pelas qualidades do Espírito, que lhe imprimem um certo caráter, principalmente ao semblante, sendo pois com razão que se apontam os olhos como o espelho da alma, o que quer dizer que o rosto, mais particularmente, reflete a alma. Porque há pessoas excessivamente feias, que, no entanto, têm alguma coisa que agrada, quando encarnam um Espírito bom, sensato, humano, enquanto há belos semblantes que nada te despertam, ou até mesmo provocam a tua repulsa. Poderias supor que só os corpos perfeitos envolvem Espíritos mais perfeitos que eles, quando encontras, todos os dias, homens de bem sob aparências disformes? Sem uma parecença pronunciada, a semelhança dos gostos e das tendências pode dar, portanto, aquilo que se chama um ar de conhecido.
218. O Espírito encarnado conserva algum traço das vitórias que obteve e dos conhecimentos que adquiriu nas existências anteriores?
— Resta-lhes uma vaga lembrança, que lhe dá o que chamamos idéias inatas.
218 – a) A teoria das idéias inatas não é quimérica?
— Não, pois os conhecimentos adquiridos em cada existência não se perdem; o Espírito, liberto da matéria, sempre se recorda. Durante a encarnação pode esquecê-lo em parte, momentaneamente, mas a intuição que lhe fica ajuda o seu adiantamento. Sem isso, ele sempre teria de recomeçar. A cada nova existência, o Espírito toma como ponto de partida aquele em que se achava na precedente.
218 – b) Deve então haver uma grande conexão entre duas existências sucessivas?
— Nem sempre tão grande como podias pensar, porque as posições são quase sempre muito diferentes, e no intervalo de ambas o Espírito pode progredir. (Ver item 216.)
219. Qual é a origem das faculdades extraordinárias dos indivíduos que, sem estudo prévio, parecem ter a intuição de certos conhecimentos, como as línguas, o cálculo etc.?
— Lembrança do passado; progresso anterior da alma, mas do qual ela mesma não tem consciência. De onde queres que elas venham? Os corposmudam, mas o Espírito não muda, embora troque a vestimenta.
220. Com a mudança dos corpos, podem perder-se certas faculdades intelectuais, deixando-se de ter, por exemplo, o gosto pelas artes?
— Sim, desde que se tenha desonrado essa faculdade, empregando-a mal. Uma faculdade pode, também, ficar adormecida durante uma existência, porque o Espírito quer exercer outra que não se relaciona com ela. Nesse caso, permanece em estado latente, para reaparecer mais tarde.
221. E a uma lembrança retrospectiva que deve o homem, mesmo no estado de selvagem, o sentimento instintivo da existência de Deus e o pressentimento da vida futura?
—E uma lembrança que ele conserva daquilo que sabia como Espírito, antes de encarnar; mas o orgulho freqüentemente abafa esse sentimento.
221 – a) E à mesma lembrança que se devem certas crenças relativas à doutrina espírita, que se encontram em todos o povos?
— Esta doutrina é tão antiga quanto o mundo. È por isso que a encontramos por toda parte, e é esta uma prova da sua veracidade. O Espírito encarnado, conservando a intuição do seu estado de Espírito, tem a consciência instintiva do mundo invisível. Mas quase sempre ela é falseada pelos preconceitos, e a ignorância mistura a ela a superstição(1)